My God, My God/pt
From Gospel Translations
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Robert Murray M'Cheyne
Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste.
Mateus 27.46
Estas são as palavras de maior segurança para os pecadores, enquanto Jesus estava pendurado no madeiro. Quanto mais medito, tanto mais acho impossível desvendar tudo o que está contido nelas. Freqüentemente você deve ter observado como algo tão pequeno pode encerrar em si uma seqüência de coisas tão grandes. Uma flâmula sobre o mastro principal é algo pequeno; todavia mostra claramente para que lado o vento sopra. Uma nuvem do tamanho da mão de um homem é algo pequeno; no entanto, pode mostrar que se aproxima uma forte tempestade. A andorinha é um pássaro pequeno; entretanto, anuncia que o verão chegou. Assim é com o homem. Um olhar, um vislumbre, uma idéia não completada — uma sentença incompleta — pode mostrar muito mais o que se passa interiormente do que um longo discurso. Assim aconteceu na morte do Salvador. Estas poucas palavras de sofrimento nos dizem mais do que grandes volumes de teologia.
Que o Senhor nos capacite a encontrar algo aqui que alimente as nossas almas.
I - A perfeição da
obediência de Cristo
1. Palavras de obediência. “Deus
meu, Deus meu.” Ele foi obediente
até a morte. Sempre tenho explicado
a você como o Senhor Jesus veio
para ser não somente um cumpridor
como também o Salvador agonizante
— não somente para sofrer tudo
que nós deveríamos ter sofrido, mas
também para obedecer a tudo que
nós deveríamos ter obedecido — não
apenas para sofrer a maldição da lei,
mas para obedecer aos mandamentos
da lei. Quando isto lhe foi proposto no
céu, Ele disse: “Agrada-me fazer a tua
“Deus Meu, Deus Meu.” 21
vontade, ó Deus meu; dentro do meu
coração, está a tua lei” (Sl 40.8). Agora,
olhe para Ele como um homem
obediente ao seu Deus. Veja como
Ele fez isso de forma tão perfeita —
até o final! Deus lhe diz: “Cumpra a
minha vontade”. Ele obedece: “Não
sabíeis que me cumpria estar na casa
de meu Pai?” (Lc 2.49). Deus lhe
diz: “Fale por mim aos pecadores”
— Ele obedece: “Uma comida tenho
para comer, que vós não conheceis.
A minha comida
consiste em fazer
a vontade daquele
que me enviou
e realizar a sua
obra” (Jo 4.32,
34).
Deus Lhe diz:
“Morra em lugar
dos pecadores —
sofra a minha ira
por amor aos inimigos — suporte a
crucificação; derrame o seu sangue e
entregue a sua vida por eles” — Ele
obedece: “Ninguém a tira de mim”
(Jo 10.18). Na noite anterior, Ele
disse: “Não beberei, porventura, o
cálice que o Pai me deu?” (Jo 18.11).
Porventura, Ele recuaria ao chegar à
cruz? Não; por três horas a escuridão
O envolveu, mas, ainda assim,
Ele disse: “Deus meu, Deus meu”.
Pecador, você tem a Cristo como
sua segurança? Veja que obediência
perfeita, em seu lugar! O grande mandamento
de morrer pelos pecadores
estava sobre Ele. Veja que obediência
perfeita!
2. Palavras de fé. “Deus meu,
Deus meu.” Estas palavras mostram
a maior fé que já existiu neste mundo.
Fé é crer na palavra de Deus, não
porque a vemos ou sentimos que
ela é a verdade, mas porque Deus a
pronunciou. Na cruz, Cristo foi rejeitado.
Ele não viu que Deus era o seu
Deus — Ele não sentiu que Deus era
o seu Deus; e, ainda assim, Ele creu
na palavra de Deus, e bradou: “Deus
meu, Deus meu”. (1) Davi demonstrou
grande fé, conforme nos mostra
o Salmo 42.7,8: “Um abismo chama
outro abismo, ao fragor das tuas
catadupas; todas
as tuas ondas e
vagas passaram
sobre mim.
Contudo, o
Senhor, durante o
dia, me concede a
sua misericórdia,
e à noite comigo
está o seu cântico,
uma oração ao
Deus da minha vida”. Ele se sentia
como que coberto por um mar de
sofrimentos. Ele não conseguia ver
nenhuma luz — nenhum escape; não
obstante, ele creu na palavra do Senhor
e disse: “Contudo, o Senhor me
concede misericórdia”. Isto é fé, que
crê mesmo quando não vê. (2) Jonas
mostrou grande fé: “Pois me lançaste
no profundo, no coração dos mares,
e a corrente das águas me cercou;
todas as tuas ondas e as tuas vagas
passaram por cima de mim. Então,
eu disse: lançado estou de diante dos
teus olhos; tornarei, porventura, a
ver o teu santo templo?” (Jn 2.3,4).
Ele estava, literalmente, no fundo do
mar. Ele não conhecia um meio de
escape — não via nenhuma luz —
não sentia nenhuma segurança; ainda
assim, ele creu na palavra de Deus.
Jesus veio não somente
para sofrer tudo que nós
deveríamos ter sofrido,
mas também para obedecer
a tudo que nós deveríamos
ter obedecido.
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Isso era ter uma grande fé. (3) Mas,
ah! Eis alguém maior que Jonas! Eis
uma fé maior que a de Davi — fé
maior que a de Jonas — a maior fé
que já existiu no mundo, no passado
ou futuro. Cristo, na cruz, estava sob
um mar mais profundo que aquele
que cobriu Jonas. As ondas agitadas
da ira de Deus lançaram-se com furor
sobre Ele. Ele foi rejeitado por seu
Pai — esteve em densas trevas — esteve
no inferno; ainda assim, creu na
palavra de Deus. “Pois não deixarás
a minha alma na morte” (Sl 16.10).
Ele não sente — Ele não vê — mas
Ele crê e brada: “Deus meu, Deus
meu”. “Ainda que ele me mate, nele
esperarei” (Jó 13.15 - RC). Querido
crente, esta é a sua segurança. Você
sempre está descrente — desconfiado
de Deus; contemple a sua segurança:
Ele nunca deixou de confiar; apeguese
a Ele — você é completo nEle.
3. Palavras de amor. “Deus meu,
Deus meu.” Estas foram as palavras
de doce submissão que Jó pronunciou,
quando Deus tirou filhos e bens:
“Nu saí do ventre de minha mãe”
(Jó 1.21). Tão doces, que ele pôde
até bendizer a Deus, mesmo quando
Ele lhe tirou tudo. Aquelas foram
palavras de amor doce e submisso, as
quais o velho Eli disse, quando Deus
lhe falou que seus filhos morreriam:
“É o Senhor; faça o que bem lhe
aprouver” (1 Sm 3.18). O mesmo
temperamento doce estava no âmago
da mulher sunamita, cujo filho veio a
morrer, quando o profeta lhe perguntou:
“Vai tudo bem contigo, com teu
marido, com o menino? Ela respondeu:
Tudo bem” (2 Rs 4.26). Mas,
ah! Aqui está um amor maior — uma
submissão maior e mais doce do que a
de Jó, de Eli ou da mulher sunamita.
Maior do que qualquer amor que já
existiu no mundo. Aqui está alguém
que fora pendurado entre a terra e o
céu — rejeitado por seu Deus — sem
um sorriso — sem qualquer consolo
— sofrendo as agonias do inferno;
mas, ainda assim, amando ao Deus
que O rejeitou. Ele não bradou:
“Cruel, Pai cruel!” Não! Mas, com
toda veemência e afeição, clamou:
“Deus meu, Deus meu”. Queridas
almas, é esta a sua segurança? Vocês
O têm como Aquele que obedeceu
por vocês? Ah! Então, vocês são
completos nEle. Vocês têm um amor
muito pequeno por Deus. Com que
freqüência vocês têm murmurado e
pensado que Deus é cruel por tirarlhes
algumas coisas; mas, vejam a
sua segurança, e regozijem-se nEle
com alegria abundante. Todo o mérito
de sua santa obediência lhes foi
imputado.
II - A intensidade dos
sofrimentos de Cristo
Ele foi rejeitado por Deus: “Deus
meu, Deus meu, por que me desamparaste?”
A Liturgia Grega diz:
“Nós vos suplicamos, por todos os
sofrimentos de Cristo, conhecidos
e desconhecidos”. Quanto mais conhecemos
os sofrimentos de Cristo,
tanto mais entendemos que eles não
podem ser perscrutados. Ah! Quem
pode explicar todo o significado do
pão partido e do vinho derramado?
1. Ele experimentou muito sofrimento
da parte de seus inimigos. (1)
Ele sofreu em todo o seu corpo. Em
“Deus Meu, Deus Meu.” 23
sua cabeça — foi coroada de espinhos
e golpeada com uma vara. Em
sua face — eles a golpearam, e Ele a
ofereceu àqueles que Lhe arrancavam
a barba: “Não escondi o rosto aos
que me afrontavam e me cuspiam”
(Is 50.6). Em seus ombros — que
carregaram a cruz pesada. Em suas
costas: “Ofereci as costas aos que
me feriam”. Em suas mãos e pés:
“traspassaram-me as mãos e os pés”
(Sl 22.16). Em seu lado — um soldado
cravou uma lança em seu lado.
Ah! Quão bem Ele pôde dizer: “Isto
é o meu corpo oferecido por vós” (Lc
22.19). (2) Ele sofreu em todos os
seus ofícios. Como profeta: “Outros
o esbofeteavam, dizendo: profetizanos,
ó Cristo, quem é que te bateu!”
(Mt 26.67-68). Como sacerdote: eles
zombavam dEle, quando ofereceu-Se
como oferta única pelo pecado. Como
rei, quando, ajoelhando-se diante
dEle, diziam: “Salve, rei dos judeus”
(Jo 19.3). (3) Ele sofreu por parte de
todos os tipos de homens — sacerdotes
e anciãos — soldados e transeuntes
— reis e ladrões: “Muitos touros
me cercam, fortes touros de Basã me
rodeiam” (Sl 22.12). — “Cães me
cercam” (Sl 22.16) — “Como abelhas
me cercaram” (Sl 118.12). (4)
Ele sofreu muito da parte do diabo:
“Salva-me das fauces do leão” (Sl
22.21). Todo o sofrimento de Cristo
foi uma batalha violenta e contínua
contra Satanás: “Despojando os principados
e as potestades, publicamente
os expôs ao desprezo, triunfando
deles na cruz” (Cl 2.15).
2. Ele sofreu muito da parte daqueles
que Ele salvou posteriormente.
Quão amargo foi o escárnio do
ladrão que naquele dia seria perdoado
e aceito! Quão amargo os brados dos
três mil, que logo chegaram a saber a
Quem estavam crucificando!
3. Da parte de seus discípulos.
Todos O rejeitaram e fugiram. João,
o discípulo amado, permaneceu de
longe, e Pedro O negou. Dizem que
quanto mais se espreme e esmaga a
flor da camomila, tanto mais doce é
o aroma que ela deixa ao redor. Ah!
Assim aconteceu com nossa doce
Rosa de Saron. O Salvador, esmagado
pelo sofrimento, exalou aquela doce
fragrância ao seu redor. São estas
pisaduras que fazem de seu nome um
bálsamo derramado.
4. Da parte do Pai. Todos os outros
sofrimentos não foram nada em
comparação a este: “Deus meu, Deus
meu, por que me desamparaste?” Os
outros sofrimentos foram limitados.
Este foi um sofrimento infinito. Ser
pisado pelo calcanhar de homens ou
demônios era algo pequeno; mas,
ah! ser esmagado pelo calcanhar de
Deus: “Todavia, ao Senhor agradou
moê-lo” (Is 53.10).
Existem três considerações
que nos mostram a
intensidade dos
sofrimentos de Cristo
1. Quem era Aquele que O rejeitou.
Não era o seu povo, Israel
— não era Judas, o traidor; não era
Pedro, que O negou; nem João, que
se recostava em seu peito. Ele poderia
ter suportado tudo se assim fosse;
mas, ah! foi seu Pai e seu Deus! As
outras coisas pouco O afetavam, em
comparação a esta. Os transeuntes
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meneavam a cabeça — Ele não disse
uma palavra. O chefe dos sacerdotes
escarneceu dEle — Ele não murmurou.
Os ladrões zombavam ao lado
dEle — Ele agia como um homem
surdo, que nada ouvia. Deus trouxe
três horas de escuridão sobre Ele —
as trevas exteriores eram a imagem
da escuridão que envolveu sua alma.
Ah! isto foi agonia infinita: “Deus
meu, Deus meu, por que me desamparaste?”
2. Quem era Aquele que foi rejeitado.
(1) Alguém infinitamente querido
por Deus. Vós me amastes antes da
fundação do mundo; todavia, vós me
rejeitastes. Eu estive desde sempre
junto de Ti — em gozo infinito diante
de Ti. Eu gozava do resplendor do
vosso amor. Ah! Por que estas trevas
tão terríveis me cercam? “Deus meu,
Deus meu.” (2) Alguém que tinha
infinita aversão pelo pecado. Que
terrível é para um homem inocente
ser lançado na cela de um criminoso
condenado! Mas, ah! quão mais
terrível foi para Cristo, que possuía
infinita aversão pelo pecado, o ser
considerado pelo Pai como pecador.
(3) Alguém que tinha o gozo infinito
do favor de Deus. Quando dois amigos
dedicados se encontram, eles
têm um gozo intenso do amor um do
outro. Quão doloroso é suportar os
olhares frios e adversos daquele em
cujo favor você encontrava este gozo
indizível! Mas, ah! isso nada é quando
comparado à dor de Cristo.
3. O que Deus fez a Ele — rejeitou-
O. Prezados amigos, contemplemos
este oceano no qual Cristo
mergulhou. (1) Ele foi privado de
todas as consolações de Deus — não
sentia o amor de Deus; não sentia que
Deus se compadecia dEle; não sentia
que Deus Lhe dava amparo. Antes
Deus era seu sol. Agora aquele sol
se transformou em trevas. Nenhum
sorriso de seu Pai — nenhum olhar
agradável, nenhuma palavra bondosa.
(2) Ele estava sem Deus — era como
se Ele não tivesse Deus. Tudo o que
Deus havia sido para Ele antes foi-
Lhe tirado. Ele estava sem Deus —
privado da comunhão com seu Deus.
(3) Ele teve o mesmo sentimento do
um condenado, quando o juiz lhe diz:
“Aparta-te de mim, maldito, que deve
ser punido com destruição eterna,
fora da presença do Senhor e da glória
de seu poder” . Ele sentiu que Deus
Lhe dissera o mesmo. Ah! este foi o
inferno que Cristo sofreu. Queridos
amigos, sinto-me como uma criancinha
lançando uma pedra em alguma
ribanceira na montanha, atento por
ouvir sua queda — mas ouvindo em
vão; ou como o marinheiro que lança
o prumo ao mar, o qual é muito fundo
— a mais longa corda não pode
alcançar. O oceano dos sofrimentos
de Cristo é insondável.
III - Respostas ao
“Por que me desamparaste?”
Por ser Ele a segurança dos pecadores
e oferecer-se em lugar deles.
1. Ele concordou com seu Pai,
antes de toda a eternidade, em colocar-
se no lugar dos pecadores e por
eles sofrer, ou seja, toda a maldição
que deveria ser lançada sobre eles,
caiu sobre Jesus. Por que Ele ficaria
tão surpreso por Deus ter derramado
“Deus Meu, Deus Meu.” 25
toda a sua ira? “Por que me desamparaste?”
O motivo é que Jesus fez
aliança para colocar-Se em lugar dos
pecadores.
2. Ele se dispôs. Ele manifestou
no semblante a intrépida resolução.
“Fiz o meu rosto como um seixo” (Is
50.7). Deus colocou o cálice diante
dEle, no jardim, dizendo: “Estás
disposto a bebê-lo ou não?” Ele
respondeu: “Não beberei, porventura,
o cálice que o Pai me deu?” (Jo
18.11). “Todavia, ao Senhor agradou
moê-lo” (Is 53.10). Por quê? Porque
Jesus, ao escolher ser a segurança,
não recuaria.
3. Ele sabia que, se não sofresse,
o mundo inteiro teria de sofrer. Foi
sua compaixão pelo mundo que O
fez assumir o lugar de Salvador:
“Viu que não havia ajudador algum
e maravilhou-se de que não houvesse
um intercessor; pelo que o seu próprio
braço lhe trouxe a salvação, e a sua
própria justiça o susteve” (Is 59.16)
. Por quê? Porque ou Ele, ou o mundo
— inferno para Ele ou para toda
a humanidade.
Lições para nós:
1. Lição para as pessoas sem Cristo.
Esteja ciente do seu perigo. Onde
quer que Deus veja pecado, Ele irá
puni-lo. Ele puniu os anjos rebeldes
— puniu Adão — o mundo antigo
— Sodoma; e, quando viu o pecado
sobre Cristo, rejeitou seu próprio
Filho. Você faz pouco caso do
pecado. Veja o que Deus pensa sobre
o pecado. Ainda que seja apenas um
pecado que esteja sobre você, se este
não tiver sido expiado, você não será
salvo. Deus diz: “Ainda que... fosse
o anel do selo da minha mão direita
— ainda que fosse meu filho amado
— eu dali o arrancaria” (Jr 22.24).
Oh! deixe-me persuadi-lo, neste dia,
a aproximar-se de Jesus Cristo!
2. Lição para aqueles que estão
em Cristo. Admire o amor de Jesus.
Oh! que mar de ira Ele suportou por
você! Que sofrimento Ele experimentou
por você, alma ingrata e vil!
O corpo transpassado e o sangue
derramado — representados no pão e
no cálice — são provas do seu amor.
Oh! que o seu coração transborde em
anelo pelo Salvador!
Diríamos a todos os que estão em
Cristo: Ele foi rejeitado, em lugar
dos pecadores. Se você O tem como
sua única segurança, nunca será
rejeitado.
Do corpo transpassado
e do sangue derramado
surge o clamor:
“Deus meu, Deus meu,
por que me desamparaste?”
Por mim — Por mim!
Que Deus abençoe a sua Palavra.